domingo, 16 de março de 2014

REPENSANDO EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM SURDEZ


A discussão sobre a educação escolar de pessoas com surdez girou, historicamente, sobre um embate entre gestualistas e oralistas, refletindo até hoje nas práticas pedagógicas, debates e pesquisas. Em contrapartida, a integralidade da pessoa com surdez, considerando suas potencialidades e necessidades reais parecem ter ficado, muitas vezes, à margem dessas discussões.
Outro foco de discussão tem sido pautado sob a égide da relevância exacerbada da especificidade de uma “cultura surda”, considerando fatores como identidade, língua, costumes, etc.
Se bem analisarmos, e sem desconsiderar tais fatores de forma equilibrada, chegaremos à conclusão que uma evidência extrema dada a eles pode levar a uma segregação. Mais ainda, conforme Bueno (2001), pode reafirmar uma dicotomização de classes. Neste caso, entre ouvintes e não ouvintes, sendo estes últimos os dominadores.
Sobre isto, Damázio (2010), afirma que

é nesse sentido de descentramento identitário que concebemos a pessoa com surdez como ser biopsicosocial, cognitivo, cultural, não somente na constituição de sua subjetividade, mas também na forma de aquisição e produção de conhecimentos.

Diante das concepções que sempre estiveram em cheque, dentre elas a oralista e a gestualista, citadas acima, a autora afirma que é preciso repensar a educação escolar dos alunos com surdez, tirando o foco do confronto entre elas e buscando a qualidade da educação escolar e das práticas pedagógicas.
Nessa perspectiva de superação de conflitos, lançou-se um olhar para uma proposta que buscasse um equilíbrio entre as vertentes linguísticas que sempre envolveram a educação de pessoas com surdez. O bilinguismo, portanto, “pretende que ambas as línguas, a gestual (LIBRAS) e a oral (Português), sejam ensinadas e usadas diglossicamente sem que uma interfira e/ou prejudique a outra” (Kozlowski, 1998).
Tais elementos parecem ter sido absorvidos pelos documentos norteadores da educação voltada para pessoas com surdez, a exemplo da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva e o Decreto 5.626 de 5 de dezembro de 2005, que determina o direito de uma educação que garanta a formação da pessoa com surdez, em que a Língua Brasileira de Sinais e a Língua Portuguesa, preferencialmente na sua modalidade escrita, constituam línguas de instrução, e que o acesso às duas línguas  ocorra de forma simultânea no ambiente escolar, colaborando para o desenvolvimento de todo o processo educativo.  
Contudo, não se pretende aqui mascarar o descumprimento da legislação e documentos pertinentes quanto às condições dos ambientes escolares, formação de professores ouvintes e surdos, atendimento educacional especializado, bilinguismo, dentre outros.
Entretanto, não se pode desconsiderar que o foco de discussão caminha inversamente ao que realmente constitui problema: práticas pedagógicas inadequadas ou indefinidas que se destinam às pessoas com surdez. Vê-se, então, que uma política pública não se concretiza com fragmentos de práticas ou com práticas arcaicas, mas com uma vivência pedagógica significativa para todos os alunos, sem exceção, aliada ao envolvimento dos responsáveis por cumprir as determinações legais.

REFERÊNCIAS

BUENO, José Geraldo Silveira. Educação inclusiva e escolarização dos surdos. Revista Integração. Brasília: MEC. nº 23, p. 37-42, Ano 13, 2001.

DAMÁZIO, Mirlene Ferreira Macedo e FERREIRA, Josimário de Paulo. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar. Fascículo 05: Educação Escolar de Pessoas com Surdez - Atendimento Educacional Especializado em Construção. Coletânea UFC-MEC/2010: p. 46-57

KOSLOWSKI, L. A Proposta bilíngüe de educação do surdo. Revista Espaço. Rio de Janeiro: INES, nº10, p.47-53, dezembro, 1998.