A discussão sobre a educação
escolar de pessoas com surdez girou, historicamente, sobre um embate entre
gestualistas e oralistas, refletindo até hoje nas práticas pedagógicas, debates
e pesquisas. Em contrapartida, a integralidade da pessoa com surdez,
considerando suas potencialidades e necessidades reais parecem ter ficado,
muitas vezes, à margem dessas discussões.
Outro foco de discussão tem
sido pautado sob a égide da relevância exacerbada da especificidade de uma “cultura
surda”, considerando fatores como identidade, língua, costumes, etc.
Se bem analisarmos, e sem
desconsiderar tais fatores de forma equilibrada, chegaremos à conclusão que uma
evidência extrema dada a eles pode levar a uma segregação. Mais ainda, conforme
Bueno (2001), pode reafirmar uma dicotomização de classes. Neste caso, entre
ouvintes e não ouvintes, sendo estes últimos os dominadores.
Sobre isto, Damázio (2010),
afirma que
é nesse sentido de
descentramento identitário que concebemos a pessoa com surdez como ser biopsicosocial,
cognitivo, cultural, não somente na constituição de sua subjetividade, mas
também na forma de aquisição e produção de conhecimentos.
Diante das concepções que
sempre estiveram em cheque, dentre elas a oralista e a gestualista, citadas
acima, a autora afirma que é preciso repensar a educação escolar dos alunos com
surdez, tirando o foco do confronto entre elas e buscando a qualidade da
educação escolar e das práticas pedagógicas.
Nessa perspectiva de
superação de conflitos, lançou-se um olhar para uma proposta que buscasse um
equilíbrio entre as vertentes linguísticas que sempre envolveram a educação de
pessoas com surdez. O bilinguismo, portanto, “pretende que ambas as línguas, a
gestual (LIBRAS) e a oral (Português), sejam ensinadas e usadas diglossicamente
sem que uma interfira e/ou prejudique a outra” (Kozlowski, 1998).
Tais elementos parecem ter
sido absorvidos pelos documentos norteadores da educação voltada para pessoas
com surdez, a exemplo da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva
e o Decreto 5.626 de 5 de
dezembro de 2005, que determina o direito de uma educação que garanta a
formação da pessoa com surdez, em que a Língua Brasileira de Sinais e a Língua
Portuguesa, preferencialmente na sua modalidade escrita, constituam línguas de
instrução, e que o acesso às duas línguas
ocorra de forma simultânea no ambiente escolar, colaborando para o
desenvolvimento de todo o processo educativo.
Contudo, não se pretende
aqui mascarar o descumprimento da legislação e documentos pertinentes quanto às
condições dos ambientes escolares, formação de professores ouvintes e surdos, atendimento
educacional especializado, bilinguismo, dentre outros.
Entretanto, não se pode
desconsiderar que o foco de discussão caminha inversamente ao que realmente
constitui problema: práticas pedagógicas inadequadas ou indefinidas que se
destinam às pessoas com surdez. Vê-se, então, que uma política pública não se
concretiza com fragmentos de práticas ou com práticas arcaicas, mas com uma
vivência pedagógica significativa para todos os alunos, sem exceção, aliada ao
envolvimento dos responsáveis por cumprir as determinações legais.
REFERÊNCIAS
BUENO, José Geraldo
Silveira. Educação inclusiva e escolarização dos surdos. Revista
Integração. Brasília: MEC. nº 23, p. 37-42, Ano 13, 2001.
DAMÁZIO, Mirlene Ferreira Macedo e FERREIRA, Josimário
de Paulo. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar. Fascículo 05: Educação Escolar de Pessoas
com Surdez - Atendimento Educacional Especializado em Construção. Coletânea
UFC-MEC/2010: p. 46-57
KOSLOWSKI, L. A Proposta bilíngüe de educação do surdo. Revista Espaço. Rio de Janeiro: INES, nº10, p.47-53, dezembro, 1998.